família

À mão

Eu nunca gostei das minhas mãos. Não há nada efetivamente errado com elas, mas elas simplesmente nunca me agradaram. Embora sejam grandes, meus dedos são finos; em uma análise mais crítica, são um pouco tortos, sobretudo o dedo médio da mão esquerda. Minhas unhas parecem acabar antes do que deveriam, como se as pontas dos meus dedos quisessem engolir as unhas. “Que fofos!”, já me disseram, mas eu discordo.

A parte de cima das mãos tem veias bem aparentes (a alegria das enfermeiras que precisaram colocar um acesso ali), enquanto as palmas já exibem pequenos calos, consequência de alguns anos de acrobacias em liras e trapézios — características que, confesso, não me incomodam. 

Há algum tempo, devido às mesmas atividades circenses, minhas mãos começaram a doer: uma dor nas juntas no meio dos dedos que durou meses de descanso e acupuntura até que desaparecesse. Não que dores nas mãos fossem uma novidade, já que aparecem toda noite, depois de alguns minutos de escrita à mão (e, desde que inventei de aprender piano, depois de alguns minutos tocando algumas míseras teclas). 

Quando estou nervoso, encaixo a mão esquerda sobre a direita, entrelaçando os dedões, e aperto com força, numa tentativa frustrada de conter a irritação, sempre percebida pelos colegas de trabalho. Quando estou empolgado, abro a mão como se estivesse alongando os dedos, o que também não passa despercebido por quem está por perto.

Na família, o consenso sempre foi de que quem tem mãos bonitas é meu pai. São grandes, com dedos alongados e proporcionais, e unhas que crescem até o fim e só pedem para ser aparadas quando não há mais dedo sobre o qual crescer. Também é um consenso que ele e sua irmã, que vivia na Itália, têm as mãos surpreendentemente idênticas, de maneira que seria impossível distingui-las em uma foto. 

Há um movimento muito específico que meu pai faz com as mãos quando está refletindo: enquanto estende uma delas à frente, como se observasse as unhas, a outra a apalpa como se a examinasse, com o dedão por cima e os outros dedos por baixo. Não seria algo particularmente notável, não fosse o fato de que eu, quando estou refletindo, me pego fazendo exatamente o mesmo movimento.

De fato, gostando ou não, minhas mãos me representam: simbolizam a minha profissão, exibem as marcas do meu esporte, carregam literalmente o meu peso; às vezes doem, às vezes decepcionam, mas no fim das contas sempre dão conta do recado. E acusam a minha origem.


Há alguns anos testemunhei o reencontro de meu pai com sua irmã, com quem conviveu muito pouco de suas nove décadas de vida. Quando ela se pôs a refletir, estendeu uma das mãos à frente, como se observasse as unhas, e apalpou-a com a outra como se a examinasse. 

Exatamente como meu pai. Exatamente como eu. 

Foto: Acervo pessoal

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