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Comer, rezar, amar… por apenas $9,90

Filmes sobre viagens, sobre pessoas que deixam tudo para trás em busca de algo, sempre me atraíram. (Filmes que falam sobre o ambiente escolar também, mas isso não vem ao caso agora.)
Fui assistir ao filme do título nesse fim de semana. Não li o livro, mas acho difícil acreditar que o filme agregue alguma experiência que já não seja possível vivenciar apenas com a leitura.
O fato de eu não acreditar por um segundo que Julia Roberts era aquela mulher em crise, ou o fato de Javier Bardem se passar por brasileiro não ajudaram muito, é verdade. O fato de toda e qualquer cidade do mundo ter sido fotografada com a mesma luz de por-do-sol tambem não. E nem o fato de que Ryan Murphy esqueceu que não está mais dirigindo “Glee”. Mas na verdade, percebi que o filme me deixou irritado.
Vou tentar explicar porquê.
Tem uma passagem no filme em um personagem diz:
“Vocês americanos sabem o que é entretenimento, mas não prazer”.
Morando já há um ano nos EUA, algumas coisas vão se tornando evidentes. Além de uma quase obsessão por entretenimento – sejam video games, filmes ou reality shows com celebridades drogadas – o consumismo é outro forte aspecto da cultura americana. Garanto que a grande maioria dos americanos que eu conheço poderiam viver com metade do que têm – o que é válido para a maioria das pessoas que eu conheço no mundo, é verdade, mas a diferença é que sinto que aqui eles não percebem isso.
Acabo de mudar para uma casa com dois dos meus melhores amigos – ambos americanos. Basta dizer que juntos temos 4 TVs (sendo 3 delas HD), um XBOX, um PS2, um PS3. TV a cabo em todos os quartos – com DVR. E HBO por “apenas 14,90”. Tem também um home theater cujas caixas de trás do sofá eu nunca vi funcionar – embora estejam simetricamente aparfusadas na parede.
O que importa é ter.
“Como assim você não tem um iPad?”.
“Você vai comprar um iPhone 3GS? Que sucata!”
O consumismo também é uma coisa que te consome. Para não ser “o cara que não quer rachar a HBO”, você acaba entrando na onda e esquecendo que você não precisa de um porta-sacos de aço inox para ser feliz.
Mas o que isso tem a ver com o filme?
Tem a ver que a história, em termos bem vagos, fala sobre um pessoa à procura da felicidade em coisas mais mundanas. Você não vê ninguém pedindo conselhos espirituais a um CEO formado em Harvard, mas a um guru desdentado em Bali. Você também não vê sabedoria naquele que juntou seu dinheirinho e hoje tem sua TV de LCD e seu sofá retrátil, mas naquele que tem uma vida simples colhendo alface no campo.
É como se eles dissessem: olha que coisa sensacional que a gente ACABOU de descobrir! Dá pra ser feliz sem um Nintendo Wii!
Peraí! Vocês estão aí, entuchando a gente de pipoca e refrigerante “que você não pode ficar sem!”, cobrando um ingresso de US$12 “que garante um sistema de som indispensável para o seu entretenimento”, pra exibir um filme que “em breve estará em Blu-Ray, que não pode faltar na sua coleção”, pra você assistir na sua TV de 60”, “por que a de 40” já ficou pequena para toda a família!”, que fala sobre “a felicidade está nas coisas simples”?
Para!
É claro que eu entendo que a história é sobre a jornada de UMA pessoa em particular, sobre SUA experiência, SUA visão. Respeito demais Liz Gilbert como escritora e também entendo que a cada nova geração, o mundo parece estar mais distante das “coisas simples”; que alguém nascido na década de 60 tem percepções diferentes do mundo atual das de alguém que nasceu nas últimas décadas.
Mas estando neste país e até certo ponto inserido nesta cultura, fica difícil não ver uma certa esquizofrenia quando colocam Julia Roberts para representar o “dolce far niente”.
“Tenha a vida simples que você sempre sonhou. Faça uma viagem espiritual para Índia. Tudo em 12x sem juros no seu VISA.”
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